“Temos que repensar o modelo institucional de formação”, afirma Paulo Amarante em palestra sobre saúde mental e educação
Atualizado em 08/03/2024
Por Bruna Abinara e João Guilherme Tuasco*
A saúde mental dos estudantes foi o tema da palestra dessa quinta-feira, 7/3, que integrou a Semana de Abertura do Ano Letivo da ENSP. A discussão sobre saúde mental e educação trouxe diferentes perspectivas sobre o assunto. Compuseram a mesa o pesquisador da ENSP/Fiocruz, Paulo Amarante; a professora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Sabrina Ferigato; e a coordenadora do Centro de Apoio ao Discente (CAD/Fiocruz), Etinete Nascimento. Os palestrantes discutiram como o ambiente e o cotidiano acadêmico podem impactar o bem-estar do corpo discente.

O CAD oferece orientação psicopedagógica e assistencial para que os alunos recebam auxílios financeiros, por meio da Política de Apoio ao Estudante da Fiocruz, e aprendam a lidar melhor com prazos e apresentações em público. “É muito importante, para quem é estudante da Fiocruz, conhecer o CAD”, destacou Etinete.
Em seguida, em sua fala, a professora Sabrina Ferigato chamou a atenção para a perda de acolhimento ao longo do período formativo dos estudantes. “Na educação infantil, o cuidado é quase uma interface direta para a educação da criança. A impressão que vamos construindo é de que, à medida em que a educação avança no tempo, o brincar vai sendo expulso, o cuidar vai sendo expulso, e entramos em uma outra lógica de produção de cuidado”, apontou.

Segundo Ferigato, é imprescindível expandir espaços de cultura e convivência, democratizar as instituições e inovar a estrutura curricular e pedagógica com foco, também, no tempo livre. A proposta da professora pressupõe uma reconciliação entre as práticas de cuidado e de produção do conhecimento. Ela também falou sobre a Comissão de Promoção, Prevenção e Cuidado em Saúde Mental na UFSCar, criada em 2021. O objetivo do grupo é promover o bem-estar mental e social de seu corpo discente a partir de uma reflexão transversal sobre a gestão da instituição. “O cuidado com a saúde mental não é uma questão apenas para ‘mentaleiros’, mas também para os coordenadores de pós-graduação, governadores de curso, estudantes e técnicos administrativos”, afirmou.
A pesquisadora ainda comentou sobre a dificuldade de inclusão de estudantes universitários nos atendimentos dos Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Para Ferigato, opiniões e preconceitos sociais atrapalham e evitam esse processo. Por isso, ela aponta para a necessidade de uma revisão das ideias sobre quem serão os usuários daquele serviço. “Os CAPS e a rede básica também precisam olhar para esse estudante, revisitando seus conceitos de quem serão os usuários. São os egressos de hospitais psiquiátricos? Sim, sempre! Mas não dá mais para recusar essa avalanche de sofrimento psíquico na juventude e manter práticas institucionais que não dialogam com os jovens”, declarou.
Por fim, Paulo Amarante destacou que, embora a saúde mental esteja associada ao contexto social, político e econômico, o assunto ainda tem sido tratado de forma reduzida à mente. “Quando falamos sobre saúde mental, estamos falando de bem-estar, bem-viver e relações intersubjetivas. O termo ficou muito genérico e passou a ser usado para tudo. Nós, da epistemologia das ciências, criticamos a divisão cartesiana mente e corpo, homem e natureza. Existe uma saúde que é só mental? Existe uma saúde que não tenha a ver com as várias condições de vida, biológicas, humanas, sociais e políticas?”, questionou o pesquisador.

Segundo o pesquisador, a universidade é um espaço altamente normativo, elitista e de rejeição, que não aceita bem a diversidade e a diferença. Sendo assim, é preciso repensar o modelo institucional de formação. “Não basta ter locais de acolhimento individual, temos que repensar as relações intersubjetivas e interpessoais dentro das instituições, assim como aquelas que nós reproduzimos nas entrelinhas da instituição”, defendeu.
*Sob supervisão da jornalista Danielle Monteiro