Thaiza explicou que o ReGHID teve como objetivo desenvolver um estudo específico sobre a saúde de mulheres migrantes venezuelanas, intitulado “Necessidades de Saúde Sexual e Reprodutiva de Mulheres e Adolescentes Imigrantes Venezuelanas no Brasil”, coordenado pela Fiocruz sob a liderança da professora Maria do Carmo Leal. O projeto utilizou métodos mistos em duas etapas: quantitativa, com inquérito transversal, e qualitativa, com componente participativo e aprofundado, conduzido principalmente pela Universidade Federal do Maranhão. Realizada em Boa Vista (RR) e Manaus (AM) — cidades que recebem o maior fluxo de venezuelanos —, a pesquisa foi coordenada pela Universidade de Southampton e desenvolvida em vários países da América Latina.
Thaiza acrescentou que, para superar a dificuldade de encontrar uma população dispersa ou “oculta”, foi adotado o método de amostragem em cadeia Respondent-Driven Sampling (RDS), que funciona como uma “bola de neve”, permitindo que participantes convidem outras mulheres, com ajustes para corrigir possíveis vieses.
Impacto das migrações sul-americanas
Thaiza apontou que o Brasil, por ter um sistema de saúde universal, oferece acesso integral e gratuito aos migrantes no Sistema Único de Saúde (SUS). Ela destacou que, desde 2015, mais de 1 milhão de venezuelanos entraram no país, e cerca de 600 mil permanecem atualmente. Por isso, o ReGHID optou por focar no corredor migratório Venezuela–Brasil, favorecido pela fronteira em Pacaraima (RR) e pela ligação rodoviária entre os dois países.
A pesquisadora explicou que, mesmo com a barreira linguística entre português e espanhol, o fluxo migratório de venezuelanos para o Brasil continua crescendo, gerando impacto nos serviços públicos. Em 2018, segundo Thaiza, o governo brasileiro implementou a “Operação Acolhida”, ação humanitária que reúne o Ministério do Desenvolvimento Social, as Forças Armadas e organismos internacionais para realizar o acolhimento dos migrantes.
No entanto, Thaiza alertou para barreiras identificadas no estudo, como a baixa utilização de métodos contraceptivos — 25% das mulheres compravam anticoncepcionais mesmo com distribuição gratuita pelo SUS —, dificuldades na realização de exames e risco de peregrinação durante o parto. Em saúde mental, observou-se que mulheres que deixaram filhos na Venezuela relataram pior autoavaliação de saúde.
Como melhorar a coleta de dados sobre saúde reprodutiva
Thaiza abordou os desafios no acompanhamento da saúde das mulheres venezuelanas após a realocação para outras regiões do Brasil. Segundo ela, é dificultado pela ausência de dados específicos sobre migrantes nos sistemas de informação, o que exige cruzamento com o Cadastro Único (CadÚnico) e aprovação ética.
Para superar essas dificuldades, Thaiza informou que foi aprovado um novo projeto com financiamento do CNPq, intitulado “Condições de Vida e de Saúde de Mulheres Migrantes Venezuelanas no Brasil”. A proposta é realizar um inquérito virtual utilizando a metodologia RDS adaptada ao formato online.
Ela detalhou que o primeiro desafio é criar um questionário abrangente e, ao mesmo tempo, conciso, com opções adequadas a diferentes contextos de vida. Para isso, a fase qualitativa, com grupos focais e entrevistas em profundidade, servirá para refinar o instrumento quantitativo. Outro desafio será garantir que as participantes convidem outras mulheres para responder — etapa essencial no RDS.
Thaiza concluiu ressaltando que parcerias com organizações não governamentais (ONGs), secretarias e grupos que já atuam com saúde de migrantes serão fundamentais para a divulgação do estudo e para conscientizar as participantes sobre a importância de sua contribuição.
*Estagiária sob supervisão da equipe de jornalismo do Informe ENSP.